Menos de 24 horas depois de ter sido homenageado pela revista Time, nos Estados Unidos, como "uma das cem personalidades mais influentes do mundo", o
juiz Sérgio Moro foi alvo de uma denúncia, em Porto Alegre, assinada
por mais de 100 advogados e advogadas, professores, pesquisadores,
bacharéis e estudantes de Direito, de 16 estados do país. Protocolada na
Corregedoria do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a representação
aponta uma série de inconstitucionalidades e ilegalidades que teriam
sido cometidas pelo juiz denunciado e que se constituiriam em infrações
disciplinares e em "comportamento impróprio ao exercício da
magistratura, desviando o Poder Judiciário dos fins propostos pelo
ordenamento jurídico".
Os
signatários da denúncia foram articulados pela Rede Nacional de
Advogados e Advogadas Populares (RENAP) e pelo Grupo de Assessoria
Jurídica Popular, vinculado ao Serviço de Assessoria Jurídica
Universitária (SAJU) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS).
A representação defende que o juiz Moro, "a
partir da ação denominada Operação Lava Jato comete desvios de
finalidade, prejudicando a segurança jurídica e institucional, que o
ordenamento jurídico determina". "Visando seus próprios anseios e não o
que determina o ordenamento jurídico, termina por desviar o Poder
Judiciário de sua função", afirma ainda. Os autores da denúncia
citam a afirmação do ministro Teori Zavascki, a propósito da divulgação
de sigilos telefônicos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva e a presidenta Dilma Rousseff. Para Zavascki, "é descabida a
invocação do interesse público da divulgação ou a condição de pessoas
públicas dos interlocutores atingidos, como se essas autoridades, ou
seus interlocutores, estivessem plenamente desprotegidas em sua
intimidade e privacidade".
A quebra de sigilo,
sustentam ainda os autores da denúncia, configura também uma violação de
prerrogativas da advocacia, uma vez que não atingiram apenas o
ex-presidente Lula, mas também o advogado deste, Roberto Teixeira. O
telefone central da sede do escritório Teixeira, Martins e Advogados,
localizada em São Paulo, também foi objeto de escuta telefônica e
conversas de todos os 25 advogados da banca com pelo menos 300 clientes
foram grampeadas, além de telefonemas de empregados e estagiários do
escritório. "Tal conduta do juiz representado viola o Estatuto da
Advocacia, Lei nº 8. 906/1994. É direito do advogado a inviolabilidade
da correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, como
dispõem o art. 7º, II, do Estatuto da Advocacia" afirma ainda a denúncia.
Essa conduta, sustentam os autores da representação, atenta contra a independência e harmonia entre poderes. "O
juiz procura, conforme suas próprias palavras, incidir na política
brasileira, extrapolando seu mister de magistrado, atingindo a
independência e harmonia entre os poderes (art. 2º, da CF). Neste
sentido, fomenta a população e instituições contra a Presidência da
República, que exerce o Poder Executivo". O documento cita as
palavras do próprio Moro em um artigo sobre a Operação Mãos Limpas
realizada na Itália, onde ele elogia a incidência que ela teve na
política daquele país: "A operação mani pulite redesenhou o quadro
político na Itália. Partidos que haviam dominado a vida política
italiana no pós-guerra, como o Socialista (PSI) e o da Democracia Cristã
(DC), foram levados ao colapso, obtendo, na eleição de 1994, somente
2,2% e 11,1% dos votos, respectivamente", escreveu Moro.
Os mais de 100
denunciantes apontam ainda outras medidas de Moro, que consideram
infundadas, como a relação obscura com empresas de comunicação, a
decretação de prisão com base em notícias de jornal ou fundamentadas no "clamor público". E denunciam a utilização da prisão provisória para
conseguir delações premiadas, prática típica de "estados totalitários, ditaduras, que prendem para conseguir confissões e provas”.
A representação lembra o artigo X da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, o artigo 14 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos, e o art. 8º do Pacto de São José da Costa Rica, que preveem a
garantia de juízes imparciais e independentes. “O Brasil é subscritor da Declaração e introjetou os pactos por meio Decreto nº 592/1992 e Decreto 678/1992, respectivamente", assinalam também os autores da denúncia.
"Percebe-se um
comportamento contumaz de violação ao ordenamento jurídico, descabido
para quem exerce a função de magistrado. A referida notícia crime
caracteriza, inclusive, a prevaricação, como também o reiterado abuso de
autoridade", afirma o texto da representação que pede a investigação das violações denunciadas e, caso sejam confirmadas, "o
afastamento do denunciados do julgamento da ação judicial e
investigações conhecidas como Operação Lava Jato, sem prejuízo de outras
sanções cabíveis".
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